
- A Convenção 158 da OIT sobre o término de relação de trabalho por iniciativa do empregador foi aprovada durante a 68ª Conferência Internacional do Trabalho (CIT), realizada em Genebra, no ano de 1985, tendo sido ratificado por 36 (trinta) e seis Estados membros da OIT, inclusive o Brasil, que o fez em 5 de janeiro de 1995.
- A referida Convenção, ao abordar o tema “término da relação de emprego”, determinou como inválido, pois, o seguintes motivos: (i) filiação a um sindicato ou a participação em atividades sindicais fora das horas de trabalho ou, com o consentimento do empregador, durante as horas de trabalho; (ii) ser candidato(a) a representante dos trabalhadores ou atuar ou ter atuado nessa qualidade; (iii) apresentar uma queixa ou participar de um procedimento estabelecido contra um empregador por supostas violações de leis ou regulamentos, ou recorrer perante as autoridades administrativas competentes; (iv) a raça, a cor, o sexo, o estado civil, as responsabilidades familiares, a gravidez, a religião, as opiniões políticas, ascendência nacional ou a origem social; (v) ausência do trabalho durante a licença-maternidade; (vi) ausência temporal do trabalho por motivo de doença ou e; (vii) o(a) empregador(a) não pode terminar uma relação de emprego por motivo relacionado ao comportamento ou ao desempenho de um(a) trabalhador(a) sem antes dar ao trabalhador ou à trabalhadora a possibilidade de se defender de acusações feitas contra ele, “a menos que não seja possível pedir ao empregador, justificadamente, que lhe conceda essa possibilidade”’.
- Observa-se, portanto, que a Convenção, conquanto não tenha feito nenhuma menção à estabilidade no emprego, procurou promover o princípio de que a demissão seja apenas em virtude de causa justificada, protegendo os trabalhadores contra a demissão imotivada, criando um patamar de proteção social à orientar os Estados membros sobre os procedimentos e garantias mínimas para tornar a demissão sem justa causa um processo que respeitasse a dignidade do empregado.
- Pois bem, em que pese a assertividade da Convenção e o fato de ter sido ratificada pelo Brasil, poucos meses após, em 20 de dezembro de 1996, o então presidente Fernando Henrique Cardoso emitiu o Decreto nº 2.100/96, que tornou público que a referida norma da OIT deixaria de ser cumprida no país por ter sido denunciada por nota do governo brasileiro à Organização.
- Com isso, em fevereiro de 1997, a Contag – Confederação Nacional dos Trabalhadores na Agricultura, acionou o STF buscando obter a declaração de inconstitucionalidade do decreto, sob a alegação de que a Convenção 158 da OIT foi aprovada e promulgada pelo Congresso e que o governo não poderia processar e deliberar a respeito da denúncia sem que esta fosse efetivamente discutida.
- Além disso, argumentou, igualmente, que o ato indiscriminado do Governo Federal teria ferido a Constituição, uma vez que o Poder competente para aprovar tratados normativos é o Congresso.
- A ação começou a ser julgada em 2003, com o voto do relator, Min. Maurício Corrêa, ocasião em que o Min. Nelson Jobim pediu as primeiras vistas. Assim seguiu-se as principais movimentações:
DATA | ANDAMENTO/INFORMAÇÕES PRINCIPAIS |
2006 | Min. Nelson Jobim proferiu voto-vista e o Min. Joaquim Barbosa pediu vista |
2009 | Min. Joaquim Barbosa proferiu voto-vista e a Min. Ellen Garcie pediu vista |
2015 | Min. Rosa Weber, sucessora de Ellen Garcie, apresentou voto-vista e o Min. Teori Zavascki pediu vista |
2016 | Min. Teori Zavascki proferiu voto-vista e o Min. Dias Toffoli pediu vista |
2022 | A vista foi devolvida pelo Min. Dias Toffoli e o Min. Gilmar Mendes pediu vistas |
2023 | Min. Gilmar Mendes devolveu o processo para julgamento |
- Ao longo do julgamento, observa-se que 3 (três) foram as vertentes dos votos, sendo elas.
IMPROCEDENTE | PARCIALMENTE PROCEDENTE | PROCEDENTE |
Nelson Jobim | Maurício Corrêa | Joaquim Barbosa |
Teori Zavaski | Carlos Ayres Britto | Rosa Weber |
Dias Toffoli | Ricardo Lewandowski | |
Gilmar Mendes | ||
André Mendonça | ||
Nunes Marques |
* IMPROCEDENTE – a denúncia de tratado internacional é feita unilateralmente pelo Presidente;
* PARCIALMENTE PROCEDENTE – Congresso é responsável pelo questionamento dos tratados que ratifica e, por isso, a revogação da eficácia do Decreto dependeria de referendo do Congresso;
* PROCEDENTE – a extinção de qualquer tratado deve passar pelo mesmo processo de validação para que um acordo internacional passe a vigorar no Brasil, isto é, precisa ser assinado pelo Presidente e submetido à ratificação do Congresso Nacional.
- Assim, no último 26 de maio, por 6 votos a 5, o Supremo Tribunal Federal decidiu manter afastada a aplicabilidade da Convenção 158 da OIT do ordenamento jurídico brasileiro.
- Dessa forma, a demissão sem justa causa continuará da maneira como está: sem que haja a necessidade de o empregador justificar o motivo pelo qual está demitindo o empregado. Nesse sentido, é a integra da decisão:
Decisão: Após o voto-vista do Ministro Gilmar Mendes, que aderia à linha proposta pelo Ministro Teori Zavascki, entendendo ser imprescindível a anuência do Congresso Nacional para a operacionalização de denúncia de Tratados Internacionais pelo Presidente da República, reconhecendo, no caso concreto, a improcedência do pedido, aderindo, ainda, à tese proposta pelo Ministro Dias Toffoli, devendo esse entendimento ter efeitos prospectivos a partir da publicação da ata de julgamento desta ação, preservando-se a eficácia das denúncias realizadas até esse marco temporal; do voto do Ministro André Mendonça, que acompanhava o voto do Ministro Dias Toffoli; e do voto do Ministro Nunes Marques, que acompanhava a divergência do Ministro Teori Zavascki, na linha do quanto ponderado pelos Ministros Dias Toffoli e Gilmar Mendes, ou seja, de que a denúncia, pelo Presidente da República, de tratados internacionais aprovados pelo Congresso Nacional exige a sua aprovação para a produção de efeitos no ordenamento jurídico interno, possuindo efeitos prospectivos a partir da publicação da ata de julgamento desta ação, preservada a eficácia das denúncias em período anterior a tal data, o julgamento foi suspenso para conclusão em sessão presencial. Não votaram, no mérito, os Ministros Luiz Fux, Roberto Barroso, Carmen Lúcia, Edson Fachin e Alexandre de Moraes, por sucederem, respectivamente, os Ministros Maurício Corrêa (Relator), Ayres Britto, Nelson Jobim, Joaquim Barbosa e Teori Zavascki. Plenário, Sessão Virtual de 19.5.2023 a 26.5.2023.
- Frisa-se, contudo, que prevaleceu ponto do voto conciliador do ex-ministro Teori Zavascki. Nesse sentido, a atual composição que ainda podia votar, aderiu a tese de que, a ação em questão, relativa exclusivamente a Convenção 158 da OIT era improcedente, mas que daqui em diante, o Congresso Nacional deverá, obrigatoriamente, participar da saída do Brasil de quaisquer tratados internacionais.
- Sendo assim, passa a constar da revisão jurisprudencial do STF que, a partir de agora, sem efeitos retroativos, as futuras denúncias de tratados e convenções devem, por obrigatoriedade, conter, igualmente, a vontade do Congresso Nacional, para além, unicamente, da do Presidente.
Pelo exposto, portanto, conclui-se que, na prática, nada mudou para o direito do trabalho, haja vista que permanece, pois, a prerrogativa dos empregadores de dispensar, sem justa causa, seus empregados, reservado o direito de fazê-los sem qualquer necessidade de motivar o ato, por mera liberalidade.