ARTIGO
A importância do comissionamento e o que você precisa saber sobre o assunto
Diante de uma nova perspectiva econômica globalizada e fundamentado nas constantes mudanças no ambiente organizacional, a remuneração variável tem ganhado, cada vez mais, grande espaço na estrutura remuneratória corporativa, sendo compreendida enquanto parcela recebida pelo empregado proveniente de fatores previamente definidos cuja medida é, geralmente, o desempenho do empregado e, essencialmente, o desempenho da empresa.
De acordo com a doutrina (WOOD JÚNIOR; PICARELLI FILHO, 2004), entre as principais razões para a utilização desse modelo de remuneração estaria a tentativa de vincular a recompensa ao esforço realizado para atingir determinado resultado. Assim, empresas na tentativa de reter talentos, desenvolvem competências e desafios para alcançar determinados objetivos estratégicos, diminuindo a importância da chamada remuneração fixa ao passo que, simultaneamente, acabam por conceder mais remunerações variáveis como meio de motivar empregados a atingir desempenhos mais favoráveis e melhores resultados. Desse modo, é possível inferir que o uso de tal remuneração favorece o aumento da eficácia organizacional, uma vez que passa a remunerar os empregados de maneira global e sinérgica, opção consideravelmente mais compatível com os anseios do corporativismo moderno.
Nesse sentido, é notório destacar que o surgimento dos planos de remuneração variável teve sua origem em há tempos, nos Estados Unidos, chegando ao Brasil tão somente a partir de 1995, com a primeira evidência de políticas de remuneração variável de grande expressão, traduzida nos acordos de participação nos lucros e resultados firmados pelo setor automobilístico. Desde então, as companhias passaram a utilizar formas distintas de estruturar a remuneração variável, originando outras espécies de retribuição, ao passo que se mantinha o objetivo principal de redirecionar todo o esforço humano para a melhoria efetiva do desempenho da empresa.
É fato que o sistema de remuneração adotado por qualquer organização deve ser simples, de fácil compreensão e, sobretudo, aceito por todas as partes relacionadas. Assim, nessa perspectiva, as remunerações variáveis passaram a ser divididas em dois grandes blocos: a remuneração variável de curto prazo e a de longo prazo. A primeira é um incentivo relacionando ao alcance de resultados em um determinado interregno, normalmente, um ano fiscal. A segunda, por outro lado, é um incentivo que se relaciona ao alcance de metas e objetivos que se voltam a manutenção e continuidade do negócio, retendo profissionais de qualidade na tentativa de valorização da empresa.
A curto prazo, pode-se citar a remuneração variável traduzida em comissão, bônus e gratificações, participação nos lucros e resultados e incentivos por projetos e remuneração por produção, à medida que, a longo prazo, pode-se citar o pagamento de bônus e participação acionária.
Comissionamento
O comissionamento é um percentual sobre as vendas realizadas pelo empregado. Quase sempre é voltado para a área comercial e, muito embora mantenha certo foco individual, visa um resultado imediato, incentivando o aumento do volume de negócios, em uma relação ganha-ganha, uma vez que alinha os objetivos dos empregados e da empresa, maximizando o desempenho desta última.
O pagamento de comissões possui natureza salarial, por tratar-se de contraprestação financeira ao trabalho realizado, como preleciona o art. 457 da CLT.
Diante disso, importa salientar que, sendo sua natureza eminentemente salarial, o pagamento de comissões enseja reflexos nos cálculos de todas as verbas contratuais e rescisórias do empregado, como por exemplo, FGTS, férias remuneradas, 13º salário, seguro-desemprego, horas extras, aviso prévio, contribuições tributárias e previdenciárias, dentre outras.
Além do comissionamento, importante destacar outras formas de remuneração:
1.1. Descanso semanal remunerado do comissionado
De acordo com a Súmula nº 27 do TST “é devida a remuneração do repouso semanal e dos dias feriados ao empregado comissionista, ainda que pracista”. Assim, para o cálculo do RSR, percebe-se que não há qualquer previsão legal de modo que passa a ser dever da empresa observar o acordo coletivo ou a convenção. Nas hipóteses em que tal acordo inexiste, passou-se a aceitar o uso, por analogia, dos critérios adotados para os empregados tarefeiros, dividindo-se o valor total das comissões recebidas no mês pelo correspondente número de dias efetivamente trabalhados, multiplicando-se o resultado pelo número de domingos e feriados existentes.
1.2. A relação entre comissão e o aviso prévio
No que se refere, por sua vez, ao aviso prévio, consubstanciado pelo art. 487 da CLT, a remuneração do empregado que trabalha no regime de comissionamento deverá equiparar-se às comissões correspondentes às vendas efetuadas no prazo do aviso acrescidas do repouso semanal remunerado (RSR) do período, somado ao salário fixo, nas hipóteses de remuneração mista.
Por outro lado, diante de aviso prévio indenizado, o empregado comissionado terá direito a média das comissões auferidas nos últimos 12 (doze) meses imediatamente anteriores de serviço ou nos meses trabalhados, nos casos em que tenha permanecido empregado por período inferior a um ano.
Deve ser observado ainda que em alguns documentos coletivos de trabalhos há garantia de correção dos valores das comissões ou, até mesmo, determinação de prazo inferior aos 12 (doze) meses para a apuração destas médias. Nesta hipótese, é vital que a empresa contemple as regras estabelecidas no acordo ou convenção coletiva e trabalho da categoria profissional.
1.3. A relação entre comissão e o pagamento do 13º salário
Referente ao pagamento do 13º salário, importante destacar que, acordando com a legislação vigente (Lei nº 4.749/1965), é devido aos empregados um adiantamento entre os meses de fevereiro e novembro de cada ano. Desse modo, tal direito trabalhista é concretizado face a efetivação de duas parcelas, a primeira antecipada, conforme supracitado, obrigatoriamente efetuada até 30.11, e a segunda paga até o dia 20 de dezembro. Seu valor corresponde a 1/12 avos da remuneração que é devida ao empregado no mês de dezembro, para cada mês trabalhado, do ano correspondente, considerando-se mês integral de prestação de serviço a fração igual ou superior a 15 dias de trabalho dentro do mês civil.
Para os empregados que recebem remuneração variável, como é o caso dos comissionados, caberá ao empregador a obrigação de realizar a média salarial do ano civil para obter o valor da remuneração devida para fins de 13º salário. Com isso, via de regra, a 1ª parcela do 13º salário será paga conforme média apurada da parte variável da remuneração de janeiro a outubro ou do momento da admissão a outubro (nas hipóteses de direito proporcional), quando se tratar de comissionistas puros. Por outro lado, tratando-se de empregado com remuneração mista, isto é, salário fixo acrescido de comissões, apura-se a média mensal desta parte variável, nos mesmos moldes acima elencados e, em seguida, adiciona-se o salário fixo contratual vigente no mês de novembro à média apurada. Destaca-se que para o cálculo da média das comissões, é necessário que se compute, igualmente, os DSR?s auferidos pelos mesmos no período verificado.
No que se refere a 2ª parcela, por sua vez, deve-se calculá-la com base na média de parcelas apuradas dos meses trabalhados até novembro. Feito o pagamento, até 20 de dezembro, é necessário que se refaça os cálculos do 13º, de modo a incluir todo os valores variáveis apurados em dezembro, devendo haver este acerto para a efetiva quitação do 13º salário, salientando-se que essa diferença, pelas novas orientações, deve ser paga ao empregado até o 5º dia útil de janeiro, ou se a empresa tiver apurado valores das variáveis por estimativa e tendo pago o 13º a maior, poderá descontar tal diferença do salário, também no mesmo prazo.
Observa-se ainda que nos cálculos das médias, o empregador deverá verificar se há qualquer previsão em documento coletivo de trabalho da respectiva categoria profissional, que garanta alguma vantagem ou condição mais benéfica aos empregados.
1.4. A relação entre comissão e horas extras
Para mais, sobre as horas extras algumas considerações também se fazem necessárias. De acordo com o Tribunal Superior do Trabalho, tais horas, quando comissionistas, possuem certas particularidades que devem ser rigidamente observadas quando da apuração e consequente pagamento aos empregados.
Portanto, podemos asseguramos que a base de valor para o salário/hora do empregado comissionado é o salário mensal pago dividido pelo número de horas efetivamente trabalhadas.
Contudo, para os chamados comissionistas mistos, cuja remuneração variável se acrescenta a um salário fixo, o cálculo de pagamento de hora extra também se difere, haja vista o entendimento da legislação de que o salário mensal desse empregado deve compreender não apenas sua jornada de trabalho, mas também eventuais “horas extras”.
Assim, sobre o valor da parte fixa, o empregado possui direito à remuneração da hora simples trabalhada mais o adicional de horas extras. Sobre a parte variável, por outro lado, incide apenas o adicional, uma vez que as horas simples já estão remuneradas pelas comissões recebidas.
1.5. A relação entre comissão e o pagamento do FGTS
No que diz respeito ao pagamento de FGTS, observa-se que nos casos em que não há salário fixo, isto é, nas hipóteses em que o empregado recebe a remuneração variável onde se inclui o comissionamento, o empregador poderá tomar como base de cálculo o valor da média dos últimos 12 (doze) meses, salvo se houver estipulação em contrário em acordo ou convenção coletiva do trabalho.
1.6. A relação entre comissão e as férias
Em relação as férias, destaca-se: no que incumbe as férias pagas em período em que o empregado não tenha efetivamente trabalhado, o valor devido será composto pelo último salário e adicionais percebidos, acrescidos da média das parcelas variáveis do interregno aquisitivo. Cabe ressaltar que o valor será sempre proporcional ao número de dias de férias e será, obrigatoriamente, acrescido do valor adicional de 1/3 constitucional. Nas férias indenizadas, por outro lado, isto é, aquelas não usufruídas, que são pagas no momento de rescisão do contrato de trabalho, o cálculo se dá na proporção de 1/12 avos por mês de trabalho acrescidos do adicional de 1/3, quando proporcionais, e pelo valor total da remuneração base, também acrescido do terço constitucional, quando integral. Em ambos os casos, o valor das férias é composto pelo último salário e adicionais percebidos pelo empregado, acrescido da média das parcelas variáveis do período aquisitivo.
2. Da rescisão contratual e dos devidos registros
Sobre esse tema, importa salientar que a rescisão contratual não prejudica a percepção das comissões e percentagens devidas ao empregado. Sendo assim, o comissionado tem o direito de receber as comissões pendentes, ainda que posteriores à rescisão contratual, haja vista serem parte integrante do salário e, portanto, seu pagamento pendente implica na obrigatoriedade de que a empresa recalcule as verbas rescisórias e efetue o pagamento de possíveis diferenças apuradas, em sede de rescisão complementar.
Cabe ao empregador, como observa o precedente normativo nº 5 do TST, proceder com todos os registros pertinentes à remuneração no contrato de trabalho e na carteira profissional do empregado, estabelecendo-se, com clareza inquestionável, os critérios de comissionamento, bem como a previsão do cálculo e a elegibilidade na Política de Comissionamento da área que o indivíduo integra.
3. Das alterações no sistema de comissionamento
Ao decorrer de todo o período da vigência de um contrato de trabalho é absolutamente aceitável que se ocorra alterações quanto ao percentual ou quanto a política de comissões aplicadas aos empregados, em virtude de inúmeros fatores que definem esse cálculo, como por exemplo maiores dificuldades de venda, mercado consumidor, demanda de produtos, dentre outros. Nesse sentido, é de extrema necessidade que as empresas permaneçam sempre alertas aos impactos que eventuais mudanças e alterações nos parâmetros da comissão possam ter sobre o salário final de seus colaboradores, uma vez que a Justiça do Trabalho caminha no sentido de que se a alteração for lesiva ao trabalhador, terá o efeito idêntico a uma redução salarial, condenado a empresa, nesse caso, ao custeio de todas as diferenças decorrentes de tal prejuízo.
Art. 468 – Nos contratos individuais de trabalho só é lícita a alteração das respectivas condições por mútuo consentimento, e ainda assim desde que não resultem, direta ou indiretamente, prejuízos ao empregado, sob pena de nulidade da cláusula infringente desta garantia.
4. Os Acordos e as Convenções Coletivas de Trabalho
Em seu art. 7º, inciso XXVI, a Constituição Federal assegura aos trabalhadores em geral, o direito ao reconhecimento das convenções e acordos coletivos do trabalho. Nesse sentido, deve-se atentar ao disposto na Lei nº 13.467/2017, que inseriu o art. 611-A na CLT, o qual dispõe que a convenção coletiva e o acordo coletivo possuem preponderância em relação a lei quando, dentre outros motivos, dispuser sobre remuneração por produtividade, incluindo, nesse sentido, a remuneração variável por desempenho individual, categoria onde se enquadra o comissionamento, nos termos do inciso IX do supracitado artigo.
Portanto, é indispensável que antes de se operar quaisquer modificações aos procedimentos relacionados aos critérios de cálculo, pagamento e política das comissões, bem como de seus reflexos nas demais verbas trabalhistas, seja verificado o que dispõe eventuais cláusulas de acordos coletivos ou convenções de trabalho vigentes e que, necessariamente, por força de lei, devem ser cumpridos.
5. Dos riscos e das vantagens do sistema de comissionamento
A remuneração variável baseada em resultados, assim como qualquer outra forma de incentivo, possui suas vantagens e desvantagens, de modo que é necessário, antes de se optar por tal sistema, a realização de um sopesamento claro e consciente para que só então se possa implementar efetivamente tais planos de compensação.
Em relação as vantagens, é possível afirmar que, diante do sistema de comissionamento, incentiva-se uma melhoria na produtividade, haja vista o estímulo à busca de entrega de resultados de alta qualidade, visando-se a compensação final pelos esforços depreendidos. Há de levar em conta ainda o aperfeiçoamento geral na performance da equipe como um todo, bem como a melhora em outros setores, como o atendimento ao cliente e o faturamento.
Quanto mais atrativo o comissionamento – e, nesse sentido, necessariamente bem estruturado – mais benefícios serão logrados ao negócio. Como a remuneração é variável e, quase sempre, depende do desempenho do funcionário de atingir determinadas metas de forma individualizada, isso significa que a remuneração pode ser igualmente crescente, incentivando o indivíduo a uma busca pelo alcance de renda elevada e seus objetivos de carreira.
Apesar do sobredito, no entanto, tal sistema deve ser planejado com extrema cautela, sob pena de comprometer a margem de lucro da empresa. Assim, no que tange as desvantagens, é necessário atentar-se a certas hipóteses de modo que a aplicabilidade dessa cultura de incentivo não seja prejudicial. Muitos são os casos em que uma má estruturação do sistema de comissionamento rendeu frustação e insegurança nos funcionários, ensejando um resultado oposto ao que seria esperado, reduzindo a produtividade e eficiência. Diferenças salariais muito acentuadas entre funcionários do mesmo setor, bem como sentimentos de ansiedade e disputa desnecessários também figuram como desvantagens hiperbólica no que se refere a esse sistema.
É necessário que se faça uma estruturação sólida e racional, de modo a evitar determinadas situações que possam culminar em ações judiciais trabalhistas. Não é incomum observar dentro de empresas que trabalham com o sistema de comissionamento, situações de comunicação rasa, falta de uma política clara e objetiva em relação aos critérios da comissão, suas regras, bases de cálculo, documentos esses a que os funcionários pudessem recorrer em caso de dúvida, para obter os esclarecimentos que lhe são devidos, quanto a, por exemplo, o valor que vão ganhar, como irão ganhar, dentre outros.
Outras questões que devem ser suprimidas a todo custo referem-se as cobranças abusivas de metas. Por isso, é de se esperar que o empregado realize esforço adequado em relação ao desempenho de suas atividades diante do pagamento de comissão, mas tal demanda deve ser exigida no limite respeitoso do bom relacionamento, jamais ridicularizando ou diminuindo, de qualquer modo, o empregado que, por qualquer que seja o motivo, não consiga auferir a performance esperada. Tal atitude, além de um risco desnecessário a empresa, sob o ponto de vista de uma acusação de assédio moral, também ensejaria um resultado oposto ao esperado quando da adoção do sistema de comissionamento.